Powered By Blogger

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

comunicação na sala de aula
In: Perrenoud, Philippe. Ensinar: Agir na Urgência, Decidir na Incerteza _ Saberes e Competências de uma Profissão Complexa. Porto Alegre. Artmed Editora, 2001
A comunicação é um motor, é uma ferramenta, um mecanismo em todos os tipos de situação de vida social, profissional, cívica e pessoal; as competências de comunicação podem ser desenvolvidas e fazem parte do capital cultural rentável, tanto na escola quanto em outros contextos; essas competências são mal divididas, em função da diversidade das personalidades e das heranças culturais.
Ter uma ideologia de comunicação é uma coisa, sobreviver e controlar a situação em uma sala de aula é outra. A comunicação em sala de aula não pode ser a expressão de um ideal, mesmo que ela esteja de acordo com o espírito do tempo, mas uma modalidade de exercício do exercício do ofício de professor e de aluno (Perrenound, 1995b, 1996g). Portanto, trata-se de uma prática complexa, inserida em um tecido de contradições ou de dilemas, que não pode ser dominada uma vez por todas. Àguisa de conclusão.
A comunicação em sala de aula passa por grande quantidade de julgamentos cotidianos.
A comunicação não é um objeto de reflexão, e menos ainda de julgamento, que possa ser separado do conteúdo de intercâmbios e da personalidade dos interlocutores. Ao julgar a forma de comunicação de uma pessoa, julgamos os eu caráter, seu capital cultural, seu saber viver, sua ética, sua motivação. Por isso, seria conveniente retomar cada um desses julgamentos e distinguir os que se referem à própria forma de se comunicar e os que visam a “outra coisa”, qualidades que a forma de comunicação evidencia: timidez, agressividade, egocentrismo.
É imperativo controlar a comunicação para ensinar. Mas, em primeiro lugar, para instaurar a própria possibilidade de um funcionamento didático. E, além disso, para viver e sobreviver no espaço fechado da sala de aula.
Evidentemente tudo seria mais simples se o professor tivesse apenas de manter a ordem e reprimir qualquer comunicação não autorizada. A imagem do soldado, do policial, do carcereiro que tomam conta do prisioneiro nos vêm imediatamente à mente, assim como a do bedel que quer que a disciplina seja respeitada.
Surge então, uma espécie de contradição permanente, o estado de equilíbrio instável, mesmo entre professores experientes. Essas contradições serão apresentadas em forma de onze dilemas todos eles propõe uma ilustração de um ditado bem conhecido: “Não se pode ter a manteiga e o creme da manteiga ao mesmo tempo”. Esses dilemas não conseguem ser totalmente superados pela experiência e nem pela formação. No entanto, a consciência de que eles ocorrem ajudam a conviver com a complexidade.
Primeiro dilema: Em torno da tomada da palavra e do silêncio. O professor pretende ter privilégio de impor silêncio e de rompê-lo, de dizer quem deve falar e quem deve calar-se quando e o porquê. No entanto, se abusar disso os alunos esquecem-se do que queriam dizer e desinteressam-se de uma conversa que não deixa nenhum espaço para improvisação, a desordem, a iniciativa, as pessoas. No máximo, darão as respostas apropriadas, aquelas que o professor espera para que a aula possa continuar, sem prazer, sem envolvimento, sem alma e portanto, sem aprendizagem.
Segundo dilema: Em torno da justiça. Em uma sala de aula a palavra não é apenas um direito das pessoas, mais ou menos regulamentado, de acordo coma tarefa a ser realizada. Também é, ou deveria ser, uma oportunidade de aprender a argumentar, de apresentar questões e dúvidas, de tentar formular uma observação, ou um raciocínio, de participar ativamente da construção de situações-problema ou de sua resolução, mesmo enfrentando vários obstáculos.
Terceiro dilema: Em torno da norma de linguagem. A relação normativa com a cultura, com o conhecimento e com a língua constitui a identidade de uma parte de professores. Há coisas que “não podemos deixar que sejam ditas”. Por fim, encucar o respeito a norma faz parte dos objetivos do ensino e das incumbências do professor. Não é fácil saber quando o fato de remeter à norma pode ser formador e quando ele desvia de uma aprendizagem mais importante.
Quarto dilema: Em torno da mentira. Mesmo reconhecendo a necessidade de uma tática entre o discurso e o pensamento, um professor é mal compreendido.
Quinto dilema: Em torno da esfera privada. Muitas vezes, o professor fica sabendo mais do que gostaria, pois as crianças ainda não sabem esconder bem a sua vida quanto os adultos.
Sexto dilema: Em torno do conflito. Não podemos cair no excesso inverno: a escola é um lugar protegido, não se pode aprender se for preciso adotar constantemente uma atitude defensiva. A escola nunca seria perdoada se deixasse eclodir a violência, o racismo, o sexismo e as relações de força, mesmo em um plano meramente verbal.
Sétimo dilema: Em torno do poder pedagógico. Embora a conversa seja fundamental na vida humana, na sala de aula ela se torna tagarelice quando escapa ao controle do professor. Ele se sente maestro da orquestra, o iniciador, o controlador dos interlocutores, dos seus conteúdos, de seu nível, de sua correção, de sua duração, de sua progressão rumo a um objetivo.
Oitavo dilema: Em torno da conversa. A idéia de que a comunicação depende de um contrato não é muito corrente. A conduta dos alunos não parecem ser objeto de negociação, mas de chamados à ordem. A única comunicação realmente aceitável na sala de aula é aquela organizada pelo professor, sobre o assunto legítimo a respeito do qual ele decidiu falar e fazer.
Nono dilema: Em torno do erro, do rigor e da objetividade. Mesmo quando os conteúdos do ensino são irrepreensíveis quanto à sua “objetividade”, sabemos agora, graças aos trabalhos didáticos, que os saberes entram em colisão com representações prévias bem instaladas, que provém da experiência profissional, pessoal, de todos os tipos de esquemas intuitivos, da cultura familiar. Portanto, o professor vê-se diante de uma escolha difícil: se não permitir a expressão das representações dos aprendizes, irá limitar-se a justapor a ela os saberes escolares.
Décimo dilema: Em torno da metacomunicação e do sentido. A comunicação é incessante na sala de aula, e a comunicação sobre a comunicação também está presente, mas em geral se trata de intervenções normativas ou de injunções do professor das quais os alunos reclamam: “Não vá tão rápido!” ou “Não estou entendendo nada”.
Décimo primeiro dilema: Prática refletida e estratégias de formação. Como dar espaço à metacomunicação e à busca sem desestabilizar o grupo-classe e sem deixar de corresponder às expectativas da instituição?
“Não devemos pensar que esses dilemas podem ser superados apenas por terem sido, enunciado, ou que a experiência é suficiente para lhes dar uma proposta pragmática estável. Eles são verdadeiras contradições, que provém da complexidade como irrupção dos antagonismos no centro dos fenômenos organizados.” (Morin, 1977, p.379).

Um comentário:

Unknown disse...

Muito bom. Parabéns.